Ao fazer catequese n\u00e3o estamos lidando apenas com destinat\u00e1rios, simples receptores de uma mensagem. Os catequizandos s\u00e3o tamb\u00e9m o que chamamos de \u201cinterlocutores\u201d, pessoas que t\u00eam algo a dizer e precisam ser ouvidas. Sendo tratados como interlocutores v\u00e3o ficar mais \u00e0 vontade para expor suas d\u00favidas, seus problemas, suas conquistas, suas qualidades.<\/p>\n\n\n\n

Fazer catequese n\u00e3o \u00e9 s\u00f3 ensinar, \u00e9 um processo de relacionamento e envolvimento.<\/p>\n\n\n\n

Cada catequizando chega at\u00e9 n\u00f3s com uma hist\u00f3ria de vida, tem seus motivos de alegria, seus questionamentos e, muitas vezes, j\u00e1 chega mergulhado em problemas s\u00e9rios. Por isso podemos estar falando de coisas que n\u00e3o se encaixam na vida de cada um deles. At\u00e9 para expor conte\u00fados evangelizadores precisamos ouvir primeiro esses interlocutores porque \u00e9 muito improv\u00e1vel conseguirmos dar uma boa resposta sem antes ouvir as perguntas que cada pessoa foi guardando no cora\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Uma quest\u00e3o s\u00e9ria com que muitas vezes me deparei no relacionamento com os catequizandos s\u00e3o os problemas familiares. Falamos de Deus como Pai, apresentamos o amor que deve unir sempre uma fam\u00edlia e nem sempre percebemos que na realidade de v\u00e1rios de nossos interlocutores esse \u00e9 um campo onde muitas feridas s\u00e3o abertas. Uma vez, por exemplo, explicando os dez mandamentos, um menino teve uma rea\u00e7\u00e3o forte ao me ouvir dizer que devemos \u201chonrar pai e m\u00e3e\u201d. Com um ar revoltado, ele falou: _Odeio meu pai! Sendo eu tamb\u00e9m filha de pais separados e tendo vivido s\u00e9rios problemas de relacionamento familiar na minha inf\u00e2ncia, percebi logo que ele precisava de uma aten\u00e7\u00e3o especial, uma ajuda, um ouvido amigo e n\u00e3o uma reprimenda ou um julgamento. Continuei desenvolvendo o tema como se ele n\u00e3o tivesse dito nada porque isso n\u00e3o era assunto para ser abordado diante da turma, seria embara\u00e7oso. Mas no final do encontro permanecemos no local e conversamos sobre o problema. Para deix\u00e1-lo \u00e0 vontade, contei primeiro as dificuldades de relacionamento que eu mesma tivera  com a fam\u00edlia quando tinha a idade dele. Ele se surpreendeu muito, n\u00e3o esperava por isso, e come\u00e7ou a me contar seus problemas familiares. Ent\u00e3o lembrei a ele a fam\u00edlia \u00f3tima que eu agora tinha e come\u00e7amos a imaginar juntos como seria a fam\u00edlia que ele iria formar quando crescesse, vendo como certas dificuldades do presente poderiam ser um forte est\u00edmulo construir um futuro bem diferente. E, \u00e9 claro, a partir desse dia a catequese ganhou para ele um novo rosto, passou a ser um espa\u00e7o de di\u00e1logo, onde a f\u00e9 e a vida se relacionavam. Para mim tamb\u00e9m foi muito \u00fatil. Eu era professora numa escola p\u00fablica e, quando chegava o Dia dos Pais, sempre alguns alunos estavam visivelmente desconfort\u00e1veis com tal comemora\u00e7\u00e3o. Ent\u00e3o, comecei a comemorar com a turma o Dia dos Pais que os meninos no futuro seriam e que as meninas teriam para seus filhos. Assim, os que tinham boas rela\u00e7\u00f5es com seus pais queriam seguir o exemplo que viam em casa e os que tinham problemas, al\u00e9m de n\u00e3o se sentirem incomodados, ficavam focados na esperan\u00e7a de um futuro melhor.<\/p>\n\n\n\n

Saber ouvir tamb\u00e9m \u00e9 importante em rela\u00e7\u00e3o ao pr\u00f3prio conte\u00fado que estivermos apresentando. Muitas mensagens b\u00edblicas podem causar rejei\u00e7\u00e3o por n\u00e3o serem bem entendidas. Afinal, estamos trabalhando com textos escritos em outra realidade , num tempo e numa cultura bem diferente do que se v\u00ea agora. \u00c9 muito importante perceber como cada um entendeu o que estamos comunicando. S\u00f3 conseguiremos isso se dermos espa\u00e7o para cada um se manifestar, dizer como entendeu a mensagem. Se temos que fazer a important\u00edssima intera\u00e7\u00e3o f\u00e9 e vida, precisamos de catequizandos que se manifestem sabendo que v\u00e3o ser ouvidos com aten\u00e7\u00e3o e benevol\u00eancia. Essa benevol\u00eancia precisa despontar at\u00e9 quando \u00e9 necess\u00e1rio mostrar que a outra pessoa est\u00e1 fazendo algo errado. H\u00e1 maneiras mais delicadas de comentar o que outra pessoa faz. H\u00e1 uma enorme diferen\u00e7a entre dizer \u201cvoc\u00ea est\u00e1 muito errado, Deus vai ficar zangado\u201d  e dizer \u201ctenho certeza de que voc\u00ea pode fazer algo melhor, Deus tamb\u00e9m confia em voc\u00ea e espera isso\u201d.<\/p>\n\n\n\n

Um bom modo de verificar se o que dizemos est\u00e1 sendo bem compreendido \u00e9 deixar que os catequizandos reformulem o que ouviram , contem para n\u00f3s com suas palavras o que entenderam e como isso se relaciona com a vida deles. Isso n\u00e3o \u00e9 feito em forma de \u201cavalia\u00e7\u00e3o\u201d , como se fosse uma prova escolar, \u00e9 uma conversa amig\u00e1vel, como Jesus gostaria. \u00c9 tamb\u00e9m uma oportunidade para o crescimento da rela\u00e7\u00e3o pessoal que precisamos ter ali.<\/p>\n\n\n\n

Acompanhar a vida de cada um tamb\u00e9m \u00e9 importante. Certo dia, eu falava de liturgia, explicando como celebrar algo torna esse acontecimento importante, mais enraizado no cora\u00e7\u00e3o de quem est\u00e1 participando. E perguntei:_N\u00e3o \u00e9 isso que acontece no nosso anivers\u00e1rio?  Ent\u00e3o um menino muito pobre, que morava na favela,  disse meio desanimado: _ Eu n\u00e3o sei, nunca tive uma festa de anivers\u00e1rio… Na mesma hora decidimos que naquele ano ele iria ter essa festa conosco. Animado, ele declarou: – Ent\u00e3o voc\u00eas t\u00eam que correr porque meu anivers\u00e1rio \u00e9 na semana que vem!  A turma fez uma festa para ele, demonstrou que o valorizava e o relacionamento de todos se enriqueceu.<\/p>\n\n\n\n

Ser catequista \u00e9 uma fun\u00e7\u00e3o pastoral, sem d\u00favida. Mas percebemos que \u00e9 tamb\u00e9m uma gratificante experi\u00eancia que nos permite conhecer pessoas, criar relacionamentos e, com isso, tornar nossa vida mais interessante, dando e recebendo?<\/em><\/p>\n\n\n\n

Therezinha Motta Lima da Cruz<\/strong><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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