Com 131 votos a favor, 117 contra e 6 abstenções, a Câmara dos Deputados da Argentina aprovou no dia 11 de dezembro o projeto de lei para legalizar o aborto, que se denomina “meia sanção”. Agora o texto será discutido no Senado.
A sessão teve início às 11h de quinta-feira, 10 de dezembro, durou cerca de 20h.
O projeto “Regulamentação do acesso à interrupção voluntária da gravidez e atenção pós-aborto” foi elaborado pelos Ministérios da Saúde e de Mulheres, Gêneros e Diversidades em coordenação com a Secretaria Jurídica e Técnica da Presidência da República.
Durante o debate, a deputada Beatriz Ávila, do partido Justiça Social, disse que “sempre defendi a vida desde a concepção e estou convencida de que é uma bandeira irrenunciável da democracia argentina”.
“Enchemos a boca para falar de democracia, de solidariedade, de igualdade, mas existe uma atitude injusta e absolutamente discriminatória que vamos colocar como precedente hoje, de ter de registar as pessoas como nascidas ou não nascidas”.
“Quem somos nós para definir quem vive e quem não vive? Dói-me que estejamos perdendo o valor da vida”, questionou.
A deputada Dina Rezinovsky, do bloco PRO da Cidade Autônoma de Buenos Aires, denunciou que “de 2018 até hoje, não foram tratados os mais de 50 projetos apresentados, tanto de oficialistas como opositores, em favor das mulheres grávidas, em favor de erradicar a pobreza. Não lhes interessa, querem apenas oferecer o aborto”.
Por sua vez, Carmen Polledo do bloco PRO pela Cidade Autônoma de Buenos Aires, afirmou que “a legalização do aborto não é uma reivindicação de nossas mulheres, mas de grupos militantes que ficaram presos nos slogans do passado”. “O aborto é algo que devemos evitar, não legalizar”, afirmou a deputada.
“Não há um fenômeno no ventre materno, há vida, por isso falamos das duas vidas, e a evidência mais contundente não é jurídica, nem científica nem mesmo ética: a evidência mais forte é o amor da mãe e o filho que carrega dentro”.
“Senhoras deputadas, senhores, meninas, meninos, esta lei não funciona”, concluiu Polledo.
Do bloco PRO por Buenos Aires, Alberto Asseff, afirmou que “a solução não é cegar vidas humanas. É impugnável e perverso que o aborto seja usado como método anticoncepcional”.
Por isso, “existem alternativas eficazes que respeitam o direito de nascer que os seres concebidos têm, mas o aborto não é, nem aceitaremos que seja um método anticoncepcional”.
“Esta câmara deve ter como foco o fortalecimento da família, promovendo mudanças no currículo escolar para conscientizar sobre o ato sexual responsável e saudável e a prevenção da gravidez indesejada. Deveria também facilitar a adoção pré-natal. Deveria incentivar a concepção responsável”, assegurou Asseff.
Detalhes do Projeto
O projeto de legalização do aborto foi apresentado por Alberto Fernández em 17 de novembro como parte de suas promessas eleitorais.
O texto permite o aborto até 14 semanas de gestação sem a necessidade de justificativa.
Após esse período, pode-se alegar a causa de estupro, bastando o pedido e a declaração das mulheres maiores de 16 anos.
Para menores entre 13 e 16 anos, apenas um “consentimento informado” por escrito será exigido, enquanto para menores de 13 anos, “a declaração não será exigida”.
Caso por alguma “restrição de capacidade” a menor não consiga dar o seu consentimento, deve dá-lo com a assistência do seu representante legal ou, na falta deste, de uma “pessoa chegada”.
Após 14 semanas de gestação, o aborto pode ser realizado sob a causa de “perigo de vida ou saúde integral” da mãe.
Líderes pró-vida observaram que, na prática, essa lei permite o aborto durante toda a gravidez.
De acordo com a lei, a prática antivida deve ser fornecida no prazo máximo de 10 dias e os profissionais de saúde devem “garantir as condições e direitos mínimos” no aborto e na atenção pós-aborto.
O projeto exige que sejam fornecidas informações sobre os diferentes métodos abortivos, os alcances e consequências da prática e os direitos da mulher “ao longo de todo o processo de atendimento, inclusive se não houver solicitação explícita”.
O projeto de legalização do aborto levanta a obrigação de denúncia em caso de estupro de menores.
Em relação à objeção de consciência institucional, o projeto indica que o profissional de saúde que objeta de consciência deve “prever e ordenar o encaminhamento para um efetor que realize” o aborto.
Cronograma do projeto do aborto
No dia 17 de novembro, Fernández apresentou o projeto do aborto junto com o chamado “Projeto dos 1000 dias” ou de ”Atenção integral à saúde e à gravidez e à primeira infância’, desenvolvido pelo Ministério do Desenvolvimento Social.
Essa ação foi qualificada pela Rede Federal da Família como uma “estratégia enganosa”, além de receber inúmeras críticas de outras organizações devido ao contexto de saúde em que a Argentina se encontra.
Em seguida, o presidente da Câmara dos Deputados, Sérgio Massa, e os presidentes das comissões de Legislação Geral, Legislação Penal, Ação Social e Saúde Pública, Mulher e Diversidade, determinaram que a tramitação do projeto fosse realizada dentro de dez dias. De 1º a 3 de dezembro, foram ouvidos 70 conferencistas a favor e contra o aborto, e na quarta-feira, 9, o parecer foi aprovado e discutido em plenário.
Durante as sessões perante as comissões, o Ministro da Saúde, Ginés González García, descreveu os bebês no útero como um “fenômeno”. Isso lhe rendeu inúmeras críticas.
Durante toda a quinta-feira, 10, e na madrugada de sexta-feira, 11, milhares de ativistas pró-vida e pró-aborto se reuniram em torno do Congresso Nacional, enquanto se realizava o debate.
Em abril de 2018, a Câmara dos Deputados também aprovou um projeto de lei sobre o aborto, com 129 votos a favor, 125 contra e 1 abstenção.
Entretanto, após intenso debate, o Senado rejeitou o projeto por 38 votos a 31, com duas abstenções e uma ausência.
Publicado originalmente em ACI Prensa. Traduzido e adaptado por Nathália Queiroz.
Fonte: ACI Digital