O arcebispo metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ), cardeal Orani João Tempesta, em artigo aponta algumas considerações para ajudar os cristãos católicos a viverem, de forma mais concreta, o Tríduo Pascal.
Confira o artigo na íntegra:
Aproximamo-nos do centro do Mistério, do Mistério da nossa salvação, apresentamos algumas considerações para ajudar a vivê-lo de forma mais concreta, e também esclarecer e aprofundar alguns aspectos teológicos e rituais que celebramos nestes dias da Paixão, Morte/Sepultamento e Ressurreição Gloriosa do Senhor.
Somos filhos de nossa época que muitas vezes, em vez de buscar explicações para nossas questões espirituais em fontes da Igreja, preferimos confiar em uma certa religiosidade, que às vezes pouco tem a ver com o espírito litúrgico e muito menos com a saudável tradição da Igreja. Motivados por essas reflexões, quisemos reapresentar o tema do Tríduo Sagrado para melhor compreender seu significado.
O Tríduo Pascal, repleto de ritos e celebrações, constitui para os cristãos o coração da liturgia e da vida cristã como memorial da essência da fé em Jesus Cristo morto e ressuscitado. O termo “tríduo pascal” refere-se, exatamente à celebração da Páscoa seguido do domingo de Páscoa, em que se comemora a paixão, morte de Cristo e Ressurreição do Senhor.
Começaremos na Quinta-feira Santa para chegar à Vigília da Noite Santa, embora talvez fosse mais lógico, do ponto de vista do desenvolvimento histórico, começar com essa celebração. É, de fato, o centro em que gira não apenas o Tríduo Pascal, mas todo o ano litúrgico é a Ressurreição do Senhor.
Na última reforma do Concílio Ecumênico Vaticano II, o tríduo se inicia na Quinta-feira Santa como uma introdução a ela. De fato, a quinta-feira pertence a dois tempos litúrgicos. Antes de tudo, é o último dia da Quaresma, com ele também termina o jejum quaresmal. Com a Missa In Coena Domini, começa propriamente o Tríduo Pascal dos três dias “Passionis et Resurrectionis Domini”, que termina com as segundas vésperas do Domingo de Páscoa. Temos, portanto, um tríduo, com quatro momentos distintos, que nos livros litúrgicos nos são explicitados. A celebração da Missa do Crisma, quase sempre feita pela manhã, ainda que não pertença ao próprio Tríduo, é importante porque serve para consagrar os óleos necessários aos Sacramentos.
A Igreja quer que a Missa In Coena Domini seja concelebrada com mais solenidade. Os temas que chamam a atenção dos fiéis são: a instituição da Eucaristia e do sacerdócio ministerial, e o mandamento do amor fraterno. A coleta foi substituída. A anterior que falava da traditio mudou com uma nova composição: Sacratissimam, Deus, frequentantibus Caenam…, que expressa melhor o sentido da celebração. Nessa perspectiva, as leituras também foram alteradas: A de 1Cor 11,20-32 foi alterada por uma passagem do Êxodo (12,1-8.11-14) que contém as prescrições para a Páscoa judaica. O Salmo segue com o responsório: “O que poderei oferecer ao Senhor… oferecei o cálice da salvação”. Introduz a segunda leitura de 1Cor 11,23-26. A passagem do Evangelho, por outro lado, não foi alterada.
Após a homilia, pro oportunitate, lavam-se os pés, o que foi simplificado em comparação com o pontifical anterior. A oração sobre as oferendas foi substituída, assim como o prefácio: o da Cruz foi substituído por um novo da Eucaristia. Conserva-se a canção Ubi caritas et amor, proposta hoje para a preparação das oferendas. Assim também é o cânone com suas partes próprias, lembrando de que hoje, Jesus institui a Eucaristia. Após a celebração, o Santíssimo Sacramento é levado em procissão até o tabernáculo provisório, onde pode realizar-se a adoração prolongada, mas as rubricas sugerem que isso seja feito sem solenidade particular. Após a celebração, ocorre o despojamento do altar. Não é mais um ritual particular, mas tudo acontece com simplicidade.
A celebração da Sexta-feira Santa não mudou muito na estrutura comemorativa. A comunhão dos fiéis foi introduzida, sendo restaurada já pela reforma de 1955. A celebração acontece no início da tarde. O padre usa vestes vermelhas, simbolizando a realeza de Cristo, e isso desde o início da celebração. A entrada do celebrante, feita sem canto, continua com a prostração e a oração silenciosa. Posteriormente, a partir do ambão, é proclamada uma das coletas à sua escolha, de nova composição. Segue-se a liturgia da Palavra. As leituras foram alteradas, e com isso a visão teológica também mudou. A primeira leitura do profeta Oséias é substituída pela do Servo Sofredor de Isaías. Mesmo a segunda, em vez da leitura do Êxodo, proclama-se hoje a carta aos Hebreus, que significa o sacrifício de Cristo. O Evangelho, segundo a tradição antiga, é sempre o de João. Pode-se fazer uma breve homilia seguida das orações solenes que, algumas revisadas e outras alteradas, expressam melhor a mentalidade do nosso tempo.
A segunda parte da celebração, a adoração da Cruz, que foi simplificada. O missal tem duas formas de rito. O Santíssimo Sacramento é trazido de volta ao altar, sem solenidade. Durante a comunhão, pode ser cantado um cântico adequado, mas não mais específico. No final, apenas uma das três orações foi preservada: Omnipotens sempiterne Deus… seguida da oração super populum. A assembleia se dissolve em silêncio. Em resumo, podemos dizer que esta celebração é geralmente um bom projeto celebrativo da Paixão do Senhor: A Liturgia da Palavra proclama a Paixão. As invocações rezam à paixão. A veneração da Cruz adora a paixão, e a Comunhão nos faz comungar com a paixão.
O Sábado Santo é o dia do grande silêncio – porque – como diz uma antiga homilia, “o Rei está dormindo. A terra está silenciosa porque o Deus feito carne adormeceu e despertou aqueles que dormem há séculos”. A igreja romana, além do ofício matutino e vespertino, porém, nunca instituiu nenhuma celebração de Cristo no sepulcro. É a celebração silenciosa do tempo suspenso, do descanso, mas não do não fazer nada. No sábado de manhã os catecúmenos eram convocados para a profissão de fé pública. Este dia foi marcado no passado por um jejum severo até a celebração da Vigília.
Vigília da Noite Santa – a Mãe de todas as vigílias. Assim define Santo Agostinho esta celebração. É colocada no centro do ano litúrgico, no centro de cada celebração. Os novos cristãos estavam se preparando para isso, os pecadores esperavam por isso, todos podiam novamente alcançar da mesa as “portas celestiais”. Representa o Totum pasquale sacramentum. De fato, não só os fatos da ressurreição são celebrados nele, mas também os da Paixão de Cristo. 1. A liturgia da luz, recorda que Cristo é a luz do mundo, Ele veio para iluminar todos os homens, o batizado é aquele que deve conduzir a sua vida, à luz de Cristo; 2. A Liturgia da Palavra, perpassa toda a história da salvação, vendo como Deus se manifestou ao povo, e em seu filho fez-se um de nós, para salvar toda a humanidade; 3. A liturgia batismal, o batismo que nos purifica é recordado, pois nele passamos da morte para vida, vida nova, também renovada com a manifestação das promessas batismais; 4. A celebração eucarística fonte e cume de toda a vida sacramental na Igreja, ela é o memorial quotidiano da Páscoa do Senhor.
Vivamos, com grande piedade, o Tríduo Pascal Sagrado!
Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)
Fonte: CNBB