O papa Francisco encorajou a unidade dos cristãos a “sonhar com uma Europa livre de ideologias”, para que seja “mais fecundada pelo Evangelho”. O pontífice fez esta declaração neste domingo, 12 de setembro, no encontro ecumênico que aconteceu na Nunciatura Apostólica de Bratislava, na Eslováquia, ao proferir seu primeiro discurso na viagem apostólica ao país. Na ocasião, encorajou “a prosseguir no caminho ecumênico, tesouro irrenunciável e valioso”.
“Como podemos desejar uma Europa que reencontre as suas raízes cristãs, se somos nós os primeiros desarraigados da plena comunhão? Como podemos sonhar com uma Europa livre de ideologias, se não temos a coragem de antepor a liberdade de Jesus às necessidades dos grupos particulares de crentes?”, questionou o papa.
Depois de expressar a sua alegria pelo fato de o primeiro encontro da viagem à Eslováquia ser com cristãos de diferentes confissões, Francisco disse que “constitui um sinal de que a fé cristã é – e quer ser – neste país semente de unidade e fermento de fraternidade”. Por isso, agradeceu pelo testemunho de “querer continuar a caminhar juntos para passar do conflito à comunhão”.
No entanto, o papa reconheceu que “é difícil exigir uma Europa mais fecundada pelo Evangelho sem se preocupar com o fato de ainda não estarmos plenamente unidos entre nós no continente e sem cuidarmos uns dos outros. Cálculos de conveniência, razões históricas e laços políticos não podem ser obstáculos irremovíveis no nosso caminho”.
“O caminho das vossas comunidades pôde ser retomado após os anos da perseguição ateia em que a liberdade religiosa esteve impedida ou sujeita a dura prova. Depois, finalmente, aquela chegou. E agora tendes em comum uma parte do caminho, experimentando como é belo, mas ao mesmo tempo difícil, viver a fé em liberdade. De fato, existe a tentação de voltar a ser escravos, não certamente de um regime, mas duma escravidão ainda pior: a interior”, advertiu o papa.
Nesse sentido, o pontífice destacou a importância da liberdade e comentou a narrativa do escritor russo Fyodor Dostoyevski, O Grande Inquisidor, em “Os Irmãos Karamazov”, que diz: “Queres ir pelo mundo e vais de mãos vazias, com uma promessa de liberdade que eles, na sua simplicidade e no seu natural desregramento, não podem sequer compreender e de que têm medo; porque é que nada foi nunca tão insuportável para o homem e para a sociedade humana como a liberdade”.
“Queridos irmãos, que isto não aconteça conosco! Ajudemo-nos a não cair na armadilha de nos contentarmos com pão e pouco mais. Pois este risco sobrevém quando a situação se normaliza, quando nos estabelecemos e acomodamos desejando levar uma vida tranquila. Assim, o objetivo em vista deixa de ser a liberdade ‘que temos em Cristo Jesus’, a sua verdade que nos faz livres, e passa a ser a obtenção de espaços e privilégios, que, segundo o Evangelho, são ‘pão e pouco mais’”, disse o papa.
Por isso, “do coração da Europa”, o pontífice pediu aos cristãos que se perguntassem: “Será que nós, cristãos, perdemos um pouco o ardor do anúncio e a profecia do testemunho? É a verdade do Evangelho que nos faz livres, ou então sentimo-nos livres quando alcançamos zonas de conforto que nos permitem gerir a vida e avançar tranquilos sem particulares contratempos?”.
“Não nos preocupemos apenas com o que possa ser útil às nossas próprias comunidades; a liberdade do irmão e da irmã é também a nossa liberdade, porque, sem a dele e a dela, não será plena a nossa liberdade”, disse o papa.
Neste sentido, Francisco recordou os santos irmãos de Tessalônica Cirilo e Metódio, para “que eles, testemunhas de um cristianismo ainda unido e inflamado pelo ardor do anúncio, nos ajudem a continuar no caminho, cultivando entre nós a comunhão fraterna no nome de Jesus”.
“Que os santos Cirilo e Metódio, ‘precursores do ecumenismo’, nos ajudem a trabalhar pela reconciliação das diferenças no Espírito Santo; por uma unidade que, sem ser uniformidade, se revele sinal e testemunho da liberdade de Cristo, o Senhor que desata as amarras do passado e nos cura dos medos e da timidez”, afirmou o papa.
Em seguida, disse que “para a difusão do Evangelho da liberdade e da unidade no tempo atual” é necessária a “contemplação”, que é própria dos povos eslavos e “que a Europa tanto necessita” para voltar a encontrar “a beleza da adoração de Deus e a importância de não conceber a comunidade de fé primariamente segundo uma eficiência programática e funcional”.
Por fim, o para declarou que “não se alcança tanto com os bons propósitos e a adesão a qualquer valor comum, como sobretudo fazendo algo em conjunto por aqueles que mais nos aproximam do Senhor”. “A partilha da caridade abre horizontes mais amplos e ajuda a caminhar mais rápido, superando preconceitos e equívocos”, disse.
“Que o dom de Deus esteja presente sobre a mesa de todos, pois, embora ainda não possamos partilhar a mesma Mesa Eucarística, podemos hospedar juntos Jesus, servindo-O nos pobres. Será um sinal mais sugestivo do que muitas palavras, que ajudará a sociedade civil a compreender, especialmente neste período doloroso, que só estando do lado dos mais fracos poderemos sair verdadeiramente todos da pandemia”, afirmou o papa.
Viagem a Budapeste e Eslováquia
O papa Francisco iniciou sua 34ª viagem apostólica internacional neste domingo. Ele visitou Budapeste, capital da Hungria, onde encerrou o 52º Congresso Eucarístico Internacional com uma missa, na qual encorajou a deixar “que o encontro com Jesus na Eucaristia nos transforme”. “Não nos resignemos com uma fé que vive de ritos e repetições, abramo-nos à novidade escandalosa de Deus crucificado e ressuscitado, Pão partido para dar vida ao mundo. Viveremos na alegria, e seremos portadores de alegria”, disse o papa na homilia.
No final da Eucaristia, Francisco conduziu a oração do Ângelus e recordou a beatificação, na Polônia, do mentor de São João Paulo II, cardeal Cardeal Stefan Wyszyński, e a da madre Elżbieta Róża Czacka. O papa propôs os novos beatos como exemplos, porque são duas pessoas “que conheceram de perto a cruz”. Por isso, rezou para “que o exemplo dos novos beatos nos estimule a transformar as trevas em luz com a força do amor”.
A visita à Eslováquia será concluída na quarta-feira, 15 de setembro, com a celebração da missa no Santuário Nacional de Nossa Senhora das Dores de Šaštin, padroeira da Eslováquia.
Outros eventos previstos na visita papal são o encontro do pontífice com os bispos, sacerdotes, religiosas e religiosas, seminaristas e catequistas na Catedral de São Martinho, em Bratislava; a visita privada ao “Centro Belém” de Bratislava, onde encontrará pessoas sem-teto e doentes que são assistidas pelas Missionárias da Caridade; um encontro com a comunidade judaica; a divina liturgia de São João Crisóstomo na Praça Mestská športová hala de Prešov; um encontro com a comunidade cigana no distrito de Luník IX, em Košice; e um encontro com jovens no Estádio Lokomotiva, em Košice.
O papa Francisco é o segundo pontífice a fazer uma viagem apostólica a esses países. São João Paulo II visitou a Hungria em 1991 e 1996, e a Eslováquia em 1990, 1995 e 2003.
Fonte: ACI Digital