Nossa Igreja vem nos pedindo uma catequese de inspiração catecumenal quando fala em Iniciação à Vida Cristã. Um dos aspectos que aparece com intensidade nesse processo é a ligação constante entre catequese e liturgia. Apresenta-se a liturgia ao mesmo tempo como “cume” e “fonte” da vida cristã. É cume porque nela expressamos com grandeza e intensidade o que nossa fé nos leva a viver, crer, experimentar. Na liturgia mostramos o que já estamos vivendo, onde queremos chegar, o que valorizamos. É uma espécie de “culminância” de nossa caminhada religiosa. Mas ao mesmo tempo é “fonte”, alimento para que a nossa fé se sustente, cresça, produza os efeitos esperados. É um processo rotativo que constrói nossa identidade e sempre recomeça: celebramos porque cremos, e crendo sentimos necessidade de celebrar sempre de novo; a fé faz a celebração ser eficiente, autêntica, construtiva, e a celebração alimenta cada vez mais nossa fé, aprofunda nossos sentimentos.
Esse efeito de alimentação contínua de sentimentos através das celebrações não existe só no ambiente religioso. Celebrações alimentam e fortalecem sentimentos em muitos outros campos. Num jogo de futebol, os hinos, uniformes, bandeiras da torcida animam os jogadores. Num casal de namorados, símbolos, canções e outros detalhes sempre relembrados reforçam sentimentos e emoções. Aniversários e festas cívicas unem pessoas e idéias. Cada tipo de celebração tem seus sinais. Por exemplo: há comidas que fazem pensar na infância na casa da vovó, há uniformes e bandeiras que fazem os soldados se sentirem mais comprometidos com sua pátria, há canções que nos emocionam porque marcaram momentos especiais de nossa vida.
O efeito dos símbolos é muito forte. Lembro, por exemplo, um almoço festivo em que comemoramos os 50 anos de nossa formatura como professoras no Instituto de Educação do Rio. O pessoal estava alegre, a conversa era animada, a comida era gostosa. Mas no finalzinho uma pequena banda começou a tocar o hino do nosso Instituto. À medida que fomos cantando, as lágrimas escorriam de nossos olhos porque a música, com seu efeito simbólico, mexeu muito com nosso coração e trouxe lembranças preciosas do que tínhamos vivido e sentido naquele lugar onde nos formamos .
Assim sendo, boas celebrações são uma força indispensável na catequese. Mas pode haver aí um perigo: se as pessoas não entenderem e não se envolverem no que está sendo celebrado, o efeito pode até ser negativo. Se alguém acha uma celebração chata, sem sentido, cansativa, em vez de ter seus sentimentos religiosos fortalecidos a pessoa se afasta ainda mais do que está sendo celebrado.
Para que uma celebração funcione bem 4 elementos devem ser considerados:
1.Um fato digno de ser celebrado: esse fato deve estar perceptível na organização da celebração, ser importante bastante para merecer ser lembrado. Isso exige uma preparação para que se perceba o motivo pelo qual nos reunimos e para que todos entendam o que está o fato que está sendo lembrado.
2.Pessoas que valorizem o que está sendo celebrado: participar só por obrigação não funciona, antes tem até um efeito contrário; se a catequese quer preparar para a liturgia precisa primeiro fazer os catequizandos se interessarem pelo que está sendo celebrado.
3.Uma certa comunhão entre os que celebram: trata-se de um acontecimento coletivo; convidamos para uma festa os nossos amigos e, se acharmos conveniente trazer pessoas estranhas, elas terão que ser bem apresentadas e acolhidas.
4.Palavras, sinais, gestos, símbolos adequados para o que se celebra e bem compreendidos: aqui a catequese tem um vasto campo de trabalho. Catequistas podem criar celebrações a partir do que foi vivido e explicado, para que os catequizandos entendam e se sintam participantes. Mas muitas vezes as pessoas na missa ouvem palavras que não entendem ou que pensam ter um sentido diferente. Por exemplo: será que todos sabem o que é kyrie eleison (Senhor, tende piedade de nós), hosana (salve, nós pedimos), santo “sacrifício” (oferta consagrada a Deus) e outras expressões usadas em nossas celebrações? Se não vamos mudar as palavras e os gestos, pelo menos temos que conversar sobre isso para que todos se sintam à vontade com o que está sendo dito e feito. Outro cuidado especial se refere às canções que vamos usar. Muitas vezes as letras não são bem compreendidas ou trazem afirmações que os catequizandos ainda não estão preparados para assumir. Lembro, por exemplo, de um menino que estava se preparando para a Primeira Comunhão e ficava perturbado com uma canção que dizia: diante do altar, Senhor, entendo minha vocação: devo sacrificar a vida por meu irmão… Ele tinha medo de dizer algo tão drástico e também não queriadizer a Deus algo que não estava disposto a fazer. E, como diz o Eclesiástes: tudo tem seu tempo; há um momento para cada coisa debaixo do céu…” (Ecl 3, 1) Então temos que celebrar considerando o que cada um está preparado para entender e assumir em cada fase da sua vida. Para evoluir nesse campo temos que dialogar bastante para entender o que cada um pensa e sente.
Há recursos variados que a catequese pode utilizar para que a liturgia venha a ser bem vivida. Podemos começar conversando sobre as comemorações e simbolismos vividos no ambiente secular. Por exemplo: Por que celebramos aniversários? Como nos sentimos desejando “muitos anos de vida” aos nossos amigos? Temos fotografias e objetos que consideramos especiais porque nos trazem lembranças importantes? Gostamos que as pessoas se lembrem de nós diante de coisas, frases, canções que deixaram boas marcas?
Se queremos preparar outros para viver bem a liturgia, temos que começar por nós mesmos. Como a liturgia afirma e alimenta a nossa fé? Que tipo de celebração mexe com nossos sentimentos? O que deveríamos fazer para viver com mais profundidade o que celebramos?
Therezinha Mota Lima da Cruz